As organizações estão constantemente se adaptando às novas tecnologias. Algumas conseguem se reorganizar diante das mudanças, enquanto outras enfrentam dificuldades justamente por não conseguirem se reestruturar. Assim como qualquer outra tecnologia, a inteligência artificial agêntica também apresenta riscos, e até maiores, exigindo uma execução multifuncional capaz de romper silos e modelos de trabalho ultrapassados.
Diante desses desafios impostos pelas novas ferramentas corporativas, Linda Mantia, diretora corporativa; Surojit Chatterjee, fundador e CEO da Ema; e Vivian S. LeeCom, MD, membro executiva da Harvard Business School dedicada à construção de sistemas de IA agêntica para empresas, analisam em artigo publicado pelo Harvard Business Review alguns princípios-chave para a implementação de sistemas agênticos que aumentam as chances de gerar o valor desejado.
Como funciona a IA agêntica
A IA agêntica consiste em sistemas compostos por agentes de IA capazes de planejar, raciocinar e agir de forma autônoma. Eles podem executar fluxos de trabalho, tomar decisões e coordenar atividades entre departamentos. Segundo os pesquisadores, alguns agentes atuam em tarefas específicas, como codificação que acelera o desenvolvimento ou integração com ferramentas SaaS (sigla em inglês para software como um serviço). Outros coordenam comandos e conectam o trabalho de diversos especialistas em um único resultado.
Quando orquestrados como um sistema, esses agentes planejam, raciocinam e agem em direção a objetivos, ajustando-se conforme as condições mudam.
Esses sistemas podem operar em aplicativos e bases de dados fragmentadas sem exigir um sistema central unificado. Sob supervisão humana, a IA agêntica funciona como uma camada inteligente que conecta processos dispersos e elimina silos, promovendo um fluxo de trabalho mais contínuo. Dessa forma, representa uma evolução significativa da automação inteligente.
Baseada nos mesmos modelos de linguagem ampla que impulsionam outras aplicações de IA, a IA agêntica é orientada a resultados — não a tarefas.
Um exemplo é a implementação da IA agêntica em operações de RH da Hitachi Digital, unidade da Hitachi voltada a soluções digitais e orientadas por IA para clientes em transformação tecnológica.
Todos os anos, os funcionários da empresa fazem mais de 90 mil perguntas sobre temas variados para uma equipe de RH composta por 120 atendentes humanos. O desafio surge da infraestrutura complexa da Hitachi, que reúne mais de 20 sistemas de registro, incluindo múltiplos sistemas de RH, provedores de folha de pagamento e ambientes de TI diferentes.
Em vez de migrar tudo para um sistema único, a empresa construiu um fluxo de trabalho agêntico. O objetivo era criar um sistema de gerenciamento de conhecimento e casos.
Assim nasceu “Skye”, o agente de IA de RH da Hitachi, projetado para atuar como primeiro ponto de contato para as dúvidas dos funcionários.
Como a IA agêntica transforma tarefas em resultados
Para a Hitachi Digital, a capacidade de acessar informações de diversas divisões e tecnologias é, por si só, uma grande conquista. Permitir que setores como folha de pagamento ou TI criem seus próprios agentes capazes de resolver problemas automaticamente redefine o sucesso: o foco passa de tarefas concluídas para resultados alcançados.
Em aplicações de IA generativa, como chatbots de atendimento ao cliente, muitas empresas acumulam milhares de transcrições de conversas. Com a IA agêntica, é possível ir além de resolver reclamações individuais: ela revisa todas as interações, identifica padrões recorrentes e atua para eliminar as causas dos problemas.
Essa evolução, de soluções pontuais para prevenção e confiabilidade sistêmica, demonstra o potencial da IA agêntica. Alcançar esse nível, porém, exige repensar a estrutura e a liderança das organizações, para que os agentes sejam orquestrados em torno de resultados, e não apenas de tarefas.
Segundo os especialistas, há três passos fundamentais para isso:
1. Projete em torno de resultados e nomeie responsáveis
A maioria das empresas ainda se organiza em torno de departamentos internos, e não das necessidades dos clientes. O marketing responde à marca, enquanto os dados respondem à TI, por exemplo.
Com a IA agêntica, cada área precisa de um “proprietário da missão”, alguém que defina objetivos, oriente humanos e agentes de IA e seja responsável pelo resultado.
Esse papel pode ser desempenhado por um gerente de produto ou proprietário da jornada, que supervisiona e otimiza toda a experiência do cliente ou usuário. Em alguns casos, é preciso designar alguém com autoridade e visão multifuncional.
2. Desbloqueie silos de dados e esclareça a lógica de negócios
Muitas empresas acreditam que a IA requer dados totalmente centralizados e padronizados. Para os pesquisadores, isso não é necessário. Agentes de IA podem operar sobre sistemas existentes, mesmo isolados, sem depender de uma “fonte única da verdade”.
Ou seja, o uso de agentes elimina a necessidade de consolidar todos os dados em um único repositório.
Ainda assim, para que aplicações multiagentes funcionem em larga escala, é preciso investir na interoperabilidade dos dados, tanto no nível semântico quanto operacional. Não é indispensável criar dicionários de dados unificados ou modelos comuns.
Sem essas restrições, a IA agêntica traz nova esperança para líderes de organizações presas a estruturas legadas e silos organizacionais.
Implementar a IA agêntica exige codificar como o trabalho é executado: como decisões são tomadas, o que define um bom resultado e como clientes e funcionários percorrem suas jornadas. Uma vez definidos esses parâmetros, a IA agêntica pode adotar e adaptar fluxos de trabalho existentes. Quanto mais complexos forem, maior será o valor gerado.
3. Desenvolva líderes e proteções adequadas aos sistemas inteligentes
Essas mudanças não terão sucesso sem líderes capazes de conduzir estratégias sólidas de gestão da mudança e administrar a transformação da IA de forma consciente.
As organizações precisam desenvolver alfabetização em IA em todos os níveis, para que os funcionários compreendam seus “colegas digitais”, saibam como eles raciocinam e quando é necessária supervisão humana.
Além disso, é essencial que os líderes lidem com medos e equívocos sobre a tecnologia e se sintam à vontade para delegar a sistemas que não podem ser totalmente roteirizados.
Para isso, devem ter a garantia de que cada fluxo de trabalho agêntico incorpora valores de liderança — definindo quais resultados são priorizados, como lidar com exceções e que necessidades atender.
A administração da IA agêntica em larga escala exige distribuição clara de responsabilidades: administradores de sistemas com controles bem definidos, profissionais de TI que gerenciam segurança e dados, e equipes de linha de frente com autonomia para intervir quando os resultados se desviam da intenção.
Bem implementado, esse equilíbrio entre autonomia e supervisão transforma a governança em um fator de escala, e não em um obstáculo ao progresso.






