Em apenas cinco anos, o Pix transformou profundamente o sistema financeiro brasileiro. Criado pelo Banco Central, o meio de pagamento deixou de ser uma inovação promissora para se tornar a espinha dorsal das transações digitais no país.
Mas, ao contrário do que se previa nos primeiros anos, o seu avanço não eliminou a relevância dos cartões. O que se viu foi uma reconfiguração do ecossistema financeiro nacional e, com ela, o surgimento de um novo equilíbrio entre os meios de pagamentos.
O impacto do Pix e a força dos cartões
O Pix é um fenômeno raro, mesmo sob padrões internacionais. Em 2024, foram realizadas 63,8 bilhões de transações, um aumento de 52% em relação a 2023, movimentando cerca de R$ 27 trilhões, segundo o Banco Central. O sistema já é utilizado por mais de 150 milhões de brasileiros, enquanto 95% das empresas o aceitam em algum canal de venda.
O Pix tornou-se onipresente – está nas grandes redes de varejo, nos aplicativos de delivery, nas maquininhas de rua e nas transferências entre amigos. Em apenas cinco anos, substituiu o TED, reduziu o uso do dinheiro em espécie e criou uma infraestrutura de pagamentos instantâneos que hoje inspira outros países.
Mas essa revolução não decretou o fim dos cartões. O setor continua robusto, movimentando R$ 4,1 trilhões em 2024, de acordo com a Abecs, e R$ 2,2 trilhões apenas no primeiro semestre de 2025 – um crescimento de 9,9% em relação ao mesmo período do ano anterior. O número de cartões de crédito ativos já ultrapassa 235 milhões, impulsionado por programas de fidelidade, benefícios e, principalmente, pela cultura do parcelamento, uma característica marcante do consumo no Brasil.
O que mudou, de fato, foi o papel de cada meio. O Pix domina o volume de transações, especialmente em pagamentos de baixo valor, transferências entre pessoas e pequenos negócios, além de ser um meio democrático, acessível a todas as camadas da população. Os cartões, por sua vez, concentram o valor agregado, com uso mais recorrente em compras parceladas, e-commerce e crédito ao consumo. Se o Pix é o meio da instantaneidade, o cartão continua simbolizando o planejamento — dois comportamentos que hoje coexistem e se complementam.
Além disso, os cartões permanecem ancorados em um ecossistema de recompensas que o Pix ainda não consegue oferecer. Milhas, pontos, cashback e benefícios exclusivos criam uma camada de valor que vai além do uso e sustentam a fidelidade do consumidor.
O futuro compartilhado dos meios de pagamento
O cenário futuro não aponta para uma substituição, mas para uma convivência cada vez mais integrada. De um lado, o Banco Central amplia as funcionalidades do Pix, como o Pix Automático e o Pix por Aproximação, que assimilam sua experiência aos cartões. De outro, emissores e adquirentes investem em carteiras digitais, tokenização, benefícios e experiência omnichannel para fortalecer o vínculo com o consumidor. A disputa, portanto, migra de hardware (cartão, QR code), para a jornada do cliente: quem oferecer a experiência mais fluida, segura e integrada sairá na frente.
Aos cinco anos, o Pix já alterou a dinâmica entre bancos, fintechs e bandeiras. Sua liquidação instantânea e baixo custo pressionam as margens de adquirência e estimulam novos modelos de negócio baseados em serviços, conciliação e crédito. Os cartões, por sua vez, preservam o papel de financiamento do consumo e a confiança do cliente, atributos ainda difíceis de replicar.
Hoje, o Brasil se consolida como um laboratório vivo da inovação financeira, em que regulação, tecnologia e comportamento do consumidor se unem para moldar o futuro dos pagamentos. Mais do que escolher entre Pix ou cartão, o desafio e a oportunidade está em construir um ecossistema cada vez mais conectado, inclusivo e eficiente, capaz de transformar a forma como pessoas e empresas se relacionam com o dinheiro.
*Clodoaldo Pontes é sênior vice-presidente de Negócios e Comercial da Evertec Brasil






