Na manhã seguinte a um colapso global da internet, o mundo acordaria em silêncio digital. Sem aplicativos, rotas ou mensagens instantâneas, a comunicação voltaria a depender de telefones fixos e cheques em papel. O cenário parece improvável, mas é tecnicamente possível, como mostrou uma falha recente em datacenters na Virgínia, nos Estados Unidos.
Segundo especialistas ouvidos pelo jornal britânico The Guardian, a base da rede mundial está assentada sobre uma estrutura antiga e concentrada em poucos pontos críticos do planeta. Essa dependência de um número restrito de provedores, somada a eventos climáticos extremos ou falhas de software, poderia desencadear uma reação em cadeia com efeitos globais.
O risco da concentração
Grande parte do tráfego e do armazenamento de dados do planeta está nas mãos de poucas empresas. Amazon Web Services (AWS), Microsoft e Google juntas respondem por mais de 60% do mercado de serviços em nuvem. Essa centralização reduz custos, mas aumenta a vulnerabilidade.
Um tornado no estado de Iowa poderia comprometer parte da infraestrutura do Google. Uma onda de calor na Virgínia afetaria datacenters da AWS. Um ataque cibernético em centros europeus completaria o colapso, congestionando o fluxo de dados até paralisar os principais serviços digitais.
Mais preocupante do que desastres físicos, porém, seria uma falha nos protocolos que compõem o núcleo da rede. Esses sistemas, que fazem computadores se reconhecerem e trocarem informações, foram criados há mais de quatro décadas e nunca foram totalmente substituídos. Uma falha de código em um provedor global poderia afetar a estabilidade da rede em todo o planeta.
O “big one” digital
Entre os cenários mais temidos está o colapso dos serviços de DNS, os catálogos que associam cada endereço da web a um servidor físico. Se um provedor como a Verisign, responsável por domínios “.com” e “.net”, fosse comprometido, bancos, hospitais e plataformas de comunicação poderiam desaparecer da rede em questão de minutos.
Cortes em cabos submarinos, ao contrário, são mais comuns e menos graves. A ONU estima que entre 150 e 200 rupturas ocorram todos os anos, quase todas rapidamente reparadas. O risco real está nos sistemas de roteamento que controlam o trânsito global de informações.
Em 1998, um grupo de hackers alertou o Congresso dos Estados Unidos para uma vulnerabilidade que poderia “derrubar a internet em 30 minutos”. Hoje, especialistas consideram essa hipótese improvável, mas não impossível. Uma combinação de sobrecarga, erro de automação e ataque cibernético seria suficiente para desestabilizar a rede em larga escala.
E depois do colapso
Se a internet de fato parasse, ninguém saberia exatamente como religá-la. Não há um botão central nem um protocolo global de reinício. “Ninguém nunca desligou a internet depois que ela foi ligada”, disse ao Guardian Steven Murdoch, professor de ciência da computação da University College London.
Durante anos, circulou no Reino Unido uma história curiosa: em caso de pane total, os engenheiros responsáveis pela infraestrutura combinariam um encontro em um pub nos arredores de Londres para decidir o que fazer. Ninguém sabe se o plano ainda existe — ou se alguém ainda se lembra do nome do bar.






