Estamos em um ponto de inflexão. A era dos combustíveis fósseis, que por décadas sustentou o crescimento econômico global, alcançou limites físicos e éticos. A intensificação da crise climática e o aumento das temperaturas globais colocam o planeta diante de uma decisão inadiável: transformar o modo como produzimos e consumimos energia.
“Estamos em uma estrada para o inferno climático, com o pé no acelerador”, alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres. A declaração é mais do que um chamado – é um alarme. A transição para fontes limpas e renováveis não é apenas recomendável; tornou-se uma urgência existencial. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), para limitar o aquecimento global a 1,5 °C – considerado o limite seguro –, o mundo precisa cortar pela metade suas emissões de carbono até 2030.
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A boa notícia é que as soluções já existem – e estão evoluindo rapidamente. Tecnologias como armazenamento gravitacional de energia, energia geotérmica avançada, reflorestamento automatizado com drones, reciclagem em larga escala de resíduos têxteis e motores a hidrogênio para a aviação estão deixando o campo das ideias para se tornarem realidade. Esses avanços indicam que é possível romper com a dependência de fontes fósseis sem abrir mão de eficiência.
Para Bill Gates, fundador da Breakthrough Energy Ventures, “a solução está na inovação”. Ele acredita que é possível criar uma matriz energética verde de custo igual ou inferior ao da energia convencional. O maior desafio não é tecnológico – é econômico, político e social. Exige redesenhar modelos de produção e consumo, repensar políticas públicas e fomentar colaborações entre governos, empresas e sociedade civil.
Confira alguns números sobre a crise climática, segundo as consulltorias McKinsey e Oliver Wyman:
- US$ 20 trilhões é o investimento necessário em energias renováveis para tentar manter a meta do Acordo de Paris
- 4,3% foi quanto aumentou o consumo global de energia, impulsionado por temperaturas recordes, eletrificação e digitalização
- 38% do crescimento da oferta global é composto por energias renováveis
- 25% foi quanto cresceram as vendas globais de veículos elétricos em 2024, totalizando 17 milhões de unidades
20 empresas que batalham para salvar o planeta
Um gêmeo para a Terra
Lockheed Martin – Estados Unidos – fundação 1995
Compreender e prever com precisão as mudanças climáticas e seus impactos é um dos maiores desafios da atualidade. Para enfrentá-lo, está em desenvolvimento o projeto Earth-2, uma plataforma digital criada pelas empresas Lockheed Martin e a Nvidia, capaz de gerar uma simulação detalhada e dinâmica do planeta Terra. Utilizando inteligência artificial e poder computacional avançado, o sistema integra imagens de satélites, dados climáticos, históricos e ambientais para prever eventos naturais extremos com alto grau de exatidão. Governos, organizações e comunidades poderão usar essas previsões para planejar ações preventivas e mitigar efeitos negativos de fenômenos como tempestades, incêndios florestais e inundações, além de avaliar cenários futuros diante das mudanças climáticas. Ao oferecer um modelo confiável e interativo da Terra, a tecnologia abre caminhos para uma gestão ambiental mais eficaz e sustentável. Com o avanço da iniciativa, espera-se garantir mais segurança e resiliência às sociedades futuras.
Bateria térmica
Fervo Energy
Estados Unidos
Fundação: 2017
A startup aposta na exploração de energia geotérmica com técnicas de perfuração horizontal adaptadas da indústria de petróleo. Essa abordagem permite transformar o subsolo em uma “bateria térmica” que fornece energia limpa 24 horas por dia. Em parceria com o Google, a Fervo inaugurou em Nevada, em 2023, a primeira usina geotérmica, com o objetivo de abastecer data centers. Agora, desenvolve o projeto Cape Station, em Utah, com capacidade prevista de 400 MW até 2028. Em 2024, a empresa captou US$ 255 milhões em aportes para expandir suas operações.
Eletricidade em alto-mar
Hitachi – Japão – fundação 1910
Quando você ouve falar de usinas eólicas em alto-mar, saiba que elas estão situadas longe da costa, mas sempre em áreas rasas. Em média, os parques eólicos ficam a 20 quilômetros do litoral e a apenas 30 metros de profundidade. Isso porque, com a tecnologia atual, as torres são pregadas ao chão – na prática, estão em terra firme. Entretanto, apenas 20% das áreas favoráveis à geração de energia eólica ficam nessas águas “rasas” (com até 80 metros). Para viabilizar os 80% restantes, a Hitachi apresentou no congresso WindEurope 2025 seu projeto para lançar, na próxima década, subestações flutuantes offshore (FOSS, na sigla em inglês). “Não estamos começando do zero: temos décadas de experiência no fornecimento de equipamentos para ambientes marinhos, incluindo plataformas de petróleo e gás, e já fornecemos equipamentos para as primeiras turbinas eólicas flutuantes do mundo”, diz Didier Mallieu, gerente de soluções renováveis da Hitachi. O desafio é grande, mas a recompensa também. “O potencial da energia eólica offshore é enorme, mais que o dobro do consumo global atual”, afirma.
Fina camada
WEG
Brasil
1961
A WEG desenvolve com a CSN um revestimento anticorrosivo com grafeno, de apenas um átomo de espessura, para ampliar a durabilidade do aço. A nanotecnologia poderá reduzir custos industriais e emissões, além de aumentar a vida útil de equipamentos.
Usina de biometano
Atvos
Brasil
2007
Em um cenário global onde a transição energética é inevitável, os biocombustíveis ganham protagonismo por serem limpos e com potencial de impacto socioeconômico positivo. Nesse contexto, a Atvos, especializada em produção de etanol e energia gerada por biomassa, avança investindo R$ 350 milhões na sua primeira usina de biometano, localizada em Nova Alvorada do Sul (MS), prevista para entrar em operação até 2026, com capacidade para 28 milhões de metros cúbicos por ano. Produzido a partir de resíduos das operações da empresa, o biometano irá viabilizar uma economia circular ao abastecer a frota da empresa. Para Bruno Serapião, CEO da Atvos, o Brasil pode liderar a transformação energética: “O etanol pode ser considerado o novo petróleo. Não precisamos desmatar uma única árvore para ampliar nossa produção, pois adotamos técnicas como a multicultura, que garantem eficiência e menor impacto ambiental”. Com mais de R$ 10 bilhões previstos em novos investimentos, a empresa pretende ampliar o uso de tecnologias inovadoras para descarbonizar economias globais e impulsionar um futuro mais sustentável.
Cortando o mal pela raiz
Samsung
Coreia do Sul
1938
Mais de 30% das emissões globais de gás carbônico vêm de fontes industriais, como fábricas. Capturar o carbono na chaminé, antes que se espalhe pela atmosfera, parece uma ideia tão óbvia quanto eficiente. No entanto, os atuais equipamentos de descarbonização – como as colunas de absorção – são grandes e pesados demais para serem utilizados em alto-mar, em navios ou plataformas de gás e petróleo. Para superar esse desafio, o braço de engenharia da Samsung se associou à empresa britânica Carbon Clean para desenvolver o CycloneCC. Ao centrifugar o CO₂em câmaras fechadas, o equipamento ocupa 90% menos espaço e tem potencial para reduzir o custo de captura em até 50%. Em 2025, a Samsung anunciou um acordo com a fabricante de plataformas Modec para uso offshore, e outro com a Aramco, para aplicação em terra firme. A petrolífera mais valiosa do mundo quer explorar o potencial da tecnologia para capturar carbono no ar, mesmo em baixa concentração.
Energia cinética
Torus
Estados Unidos
2021
A Torus criou uma bateria mecânica que armazena energia cinética gerada por um disco que roda em alta velocidade. A empresa fechou um acordo para atender 20 mil casas e dobrar a capacidade de geração de energia do estado de Utah, nos Estados Unidos, nos próximos dez anos.
Papel sustentável
Suzano
1924
Brasil
Líder global em celulose, em 2025 a Suzano fechou um acordo com a startup israelense Marvin, que usa IA na gestão de uso da terra e cadeia de suprimentos. O objetivo é desenvolver uma plataforma capaz de avaliar os impactos do clima nos 2,7 milhões de hectares de terras da Suzano destinados à produção.
Escudo térmico
Nano Tech Materials
2020
Estados Unidos
Desenvolve partículas cerâmicas isolantes que, aplicadas em telhados e paredes, reduzem o calor (a ponto de cortar à metade o uso de ar-condicionado) e o risco de incêndios. A tecnologia da NanoTech já foi aplicada em instalações da SpaceX e em rodovias da Califórnia.
Ar despoluído
Spiritus
2022
Estados Unidos
A empresa captou US$ 30 milhões para desenvolver uma nova tecnologia de captura direta de carbono do ar. O objetivo é reduzir o custo por tonelada capturada de US$ 1 mil para US$ 100. Apenas um dos projetos, em Wyoming, terá potencial para sequestrar 2 megatoneladas de CO2 por ano.
O motor do futuro
Zero Avia
2018
Estados Unidos
A empresa desenvolve motores elétricos movidos a hidrogênio para aeronaves. Em 2024, firmou acordos com a American Airlines para entregar cem motores, e com a Ecojet para 22 unidades. O motor ZA600, para aeronaves de até 20 lugares, promete voos com zero emissão de carbono.
Lixo de valor
Ambipar
Brasil
1995
A Ambipar está apostando em inovação para transformar resíduos em ativos ambientais. Em 2024, inaugurou em São José dos Campos (SP) a maior planta de mineração urbana da América Latina, com capacidade para processar 80 mil toneladas de lixo e recuperar metais como ferro para a indústria. Outra iniciativa da empresa é o reflorestamento de áreas devastadas por catástrofes ambientais. A ação é realizada por meio de drones, que lançam ao solo biocápsulas feitas de colágeno reciclado e recheadas de sementes de plantas nativas da Mata Atlântica. “Estamos falando de regenerar florestas com resíduos e extrair valor do que antes era descartado”, diz Fabrício Fonseca, presidente da Ambipar Brasil.
Fio circular
Ambercycle
2015
Estados Unidos
Roupas descartadas são transformadas em um poliéster regenerado por reciclagem molecular. A tecnologia separa fibras quimicamente, remove impurezas e gera fios com qualidade virgem e menor impacto ambiental. Marcas parceiras, como Zara e Ganni, já lançaram roupas com o produto.
Algodão sintético
Galy
2019
Estados Unidos
A startup desenvolveu um algodão cultivado em laboratório que cresce dez vezes mais rápido, com uso reduzido de água. Em 2024, captou US$ 33 milhões em rodada liderada pela Breakthrough Energy Ventures, de Bill Gates. O produto também atraiu investimentos de empresas como Inditex e H&M.
Rastreamento de CO2
GHGSat
2011
Canadá
O satélite Vanguard é o primeiro em órbita capaz de detectar emissões de CO2 de fábricas específicas. Com resolução de 25 metros, fornece dados precisos para rastrear emissões em setores como energia e construção civil. Em 2024, firmou parceria com a Mitsubishi para fornecer o serviço no Japão.
Barreira de proteção
Regenesis – 1994 – Estados Unidos
Desenvolveu o SourceStop, tecnologia de carvão ativado que bloqueia a infiltração no solo de PFAs (os “químicos eternos”). A novidade não só evita a contaminação do solo no longo prazo como previne a migração dos PFAs para águas subterrâneas, eliminando o risco para comunidades próximas.
Esfera ideal
3M
Estados Unidos
1902
Viabilizar o transporte de hidrogênio em sua forma líquida é uma medida urgente. A dificuldade está em criar um isolamento térmico eficiente para evitar perdas por evaporação. Para resolver o problema, a 3M desenvolveu microesferas de vidro que aumentam significativamente a capacidade de isolamento, durabilidade e economia de peso dos tanques criogênicos em relação a materiais tradicionais. As esferas já começam a ser usadas comercialmente para evitar perdas em instalações de armazenamento e viabilizar o transporte seguro e econômico de hidrogênio entre diferentes países ou regiões.
A força da Gravidade
Energy Vault
Suíça
2017
Blocos de concreto empilhados e pendurados em guindastes podem parecer parte de uma obra comum, mas são a base de um sistema inovador de armazenamento de energia por gravidade criado pela Energy Vault. Quando o guindaste libera os blocos, que caem com a força da gravidade, a energia potencial é convertida em eletricidade, criando uma alternativa às baterias químicas. O sistema opera sem risco de incêndio, suporta climas extremos e permite armazenamento de curto a longo prazo. Em 2024, foi conectado à rede elétrica na China.
Gás bovino
Dsm-Firmenich
Suíça/ Holanda
2023
Na busca por reduzir o impacto ambiental da pecuária, pesquisadores desenvolveram um aditivo que interfere no processo digestivo dos ruminantes, diminuindo significativamente a liberação de metano – um dos gases de efeito estufa mais potentes. A fórmula atua diretamente no estômago, bloqueando uma enzima responsável pela produção do gás. Estudos mostraram redução de até 45% nas emissões em bois e cerca de 30% em vacas leiteiras. Aprovado nos Estados Unidos em 2024, o aditivo também foi testado no Brasil, e há uma fábrica em construção na Escócia para produção em maior escala.
Pegada sem carbono
Pavegen
Inglaterra
2009
A Pavegen acredita que um pequeno passo para um homem pode ser um grande passo para a humanidade. A startup desenvolve pavimentos capazes de transformar a energia cinética da caminhada das pessoas em energia elétrica. Em dezembro, apresentou o Solar+, que combina a captação de energia cinética com o potencial dos painéis solares. Com isso, a geração de eletricidade aumentou em até 30 vezes. “O Sol está sempre brilhando em nossos principais mercados no Oriente Médio, e pensamos em aproveitar ao máximo essa fonte abundante de energia, junto com o elemento cinético”, disse o fundador e CEO, Laurence Kemball-Cook.
